O promotor mineiro Rogério Greco é um defensor de policiais. Autor de diversos livros que focam no Direito Penal, apontado como o “mentor de concurso” pelo trabalho realizado como professor em cursos preparatórios, Rogério Grecco é um jurista renomado que tem sua mais nova incursão com o livro “Atividade Policial - Aspectos Penais, Processuais Penais, Administrativos e constitucionais”. O olhar do promotor para os policiais não fica apenas na ótica do Direito, mas ganha também contornos de uma defesa de admirador.
“Ser policial não é para qualquer um. Fácil eu ser entrevistado aqui por você, em um hotel, enquanto outras pessoas estão tomando tiro de fuzil. É difícil a atividade policial. A sociedade precisa entender que são pessoas diferenciadas, que tem amor pelo que faz”, comenta o jurista, que esteve em Natal ministrando um curso e lançando a nova obra na livraria Siciliano. Ele considera policiais heróis. Mas o que preferiria Rogério Greco: ir para guerra ou ser policial nas ruas brasileiras? “Acho que iria preferir ir para guerra. Pelo menos você sabe onde está o inimigo. No Brasil você não sabe”, responde de pronto.
Greco não poupa críticas a falta de cumprimento das leis punitivas para os criminosos de classe média. O professor é contundente ao afirmar que os genocidas estão “soltos”: “Precisa de um combate sério. O corrupto é um genocida. O corrupto é aquele cara que você está tirando foto dele nos melhores restaurantes de Natal, mas ele está lesando o erário em milhões e milhões. É esse cara que não deixa chegar o remédio na farmácia, é esse cara que não deixa o idoso ter um atendimento digno, esse é o genocida”, diz, em tom de desabafo, Rogério Grecco.O convidado de hoje do 3 por 4 é um professor que dá uma lição de cidadania, um promotor defensor dos policiais, um escritor que fala como mestre, um cidadão simples e simpático ao espectador.
Tribuna do Norte - Os policiais hoje causam mais medo do que segurança na população. O que levou a essa inversão de valores?
Rogério Greco - A ditadura teve uma influência muito forte com relação a isso. Havia muito abuso, muito arbítrio e depois da Constituição de 1988, depois que o Brasil se transformou em uma democracia começou a haver renovação nos quadros da polícia. Essa renovação tem sido muito importante, muito útil. Hoje os estudantes que prestam concurso de forma geral gostam da atividade policial. O único problema que ainda vê na atividade policial é a questão da remuneração que faz com que as pessoas migrem para outras profissões. Eu, por exemplo, sou do Ministério Público, mas meu concurso era para delegado de Polícia Federal. Não fiz porque não surgiu oportunidade naquela época. A função policial é muito bonita. Tem havido renovação, mudança de mentalidade na polícia. Uma polícia que respeita o direito do cidadão. Mas infelizmente a imagem que ficou foi a antiga, da polícia truculenta, que gosta de bater nas pessoas. Mas não é assim que a coisa acontece.
TN - Mas há também os casos de corrupção dentro da polícia. O senhor credita isso à questão de caráter ou questão de falta de incentivo para esses profissionais?
RG - Questão de caráter. Sabe por quê? Porque se você for ao Congresso Nacional quantos são corruptos? Graças a Deus que as coisas têm mudado. Mas quantos juízes, quantos desembargadores envolvidos, quantos ministros envolvidos em problema de corrupção? Agora o contingente policial é maior, quanto mais gente maior, proporcionalmente, a corrupção. Não é que exista só na polícia. Em todos os setores tem corrupção.
TN - O tratamento destinado as Polícia Civil, Militar e Federal é diferente. A Polícia Federal usufrui de uma estrutura melhor. O senhor tem essa mesma percepção?
RG - Tenho porque a estrutura é diferente. A estrutura da Polícia Federal é diferente. Quando você lida com a União a estrutura é sempre melhor. Mas isso está modificando nos Estados. As Polícias Civis e Militares são o front da batalha. Eles que recebem a primeira vítima, o indiciado, o primeiro acusado. Acho que a política de remuneração da polícia, a estrutura principalmente da Civil e Militar, deveria melhorar muito.
TN - O policial brasileiro hoje é um predestinado, um herói por trabalhar em condições tão adversas?
RG - É sim. Eu tenho contato muito grande com a turma do BOPE do Rio de Janeiro. Eu vejo ali aqueles policiais, o amor que eles têm pela profissão. Em nada eles são mais remunerados que os outros. São altamente especializados, são pessoas que introjetaram dentro deles esse amor, esse gosto pela atividade policial. Quando se fala de policial do BOPE, qualquer policial tem orgulho de ser do BOPE. Agora ao passo que nas outras polícias já há aquela resistência de sempre reclamando, sempre murmurando. Claro que o policial do BOPE quer ganhar mais, mas isso não faz com que ele seja corrupto. Tem outras polícias importantes. No meu Estado, em Minas Gerais, tem uma polícia boa, mas ainda está longe de ser o ideal. A gente tem que valorizar. Acho que o principal é que a gente tem que aprender a não falar mal da polícia. O policial se sente desprestigiado, desmerecido, ele se sente com vergonha de ser policial. Ao invés de ter orgulho ele fica envergonhado. Eu ensino meus filhos a gostarem da polícia. Meu filho já chegou a pedir autógrafo ao policial. Acho que um bom relacionamento é o que está faltando.
TN - A sociedade é injusta com a polícia?
RG - É. Ser policial não é para qualquer um. Fácil eu ser entrevistado aqui por você, em um hotel, enquanto outras pessoas estão tomando tiro de fuzil. É difícil a atividade policial. A sociedade precisa entender que são pessoas diferenciadas, que tem amor pelo que fazem. Veja que sou do Ministério Público não sou da polícia. Vejo por exemplo você fazer uma incursão na favela, todo dia no Rio morre um policial. É difícil, tem que valorizar o policial.
TN - Se o senhor fosse um policial preferia ir para guerra ou fazer segurança nas ruas do Brasil?
RG - É difícil, pergunta difícil. Mas acho que iria preferir ir para guerra. Pelo menos você sabe onde está o inimigo. No Brasil você não sabe.
TN - Enveredando agora especificamente pela lei, como o Direito Penal pode evoluir para coibir efetivamente os crimes?
RG - Não pode. Essa não é nossa finalidade. É porque as pessoas vendem o peixe errado no Direito Penal. Nosso problema não é jurídico, nosso problema não é legal, nós temos lei demais, nossa lei é boa. Precisa de um ajuste e outro, mas não é isso que as pessoas estão alardeando. Elas falam que tem que rasgar o Código completo. Isso é conversa. Isso não existe. O que tem que acontecer é o Governo implementar políticas públicas. Se não houvesse desigualdade social o índice de crimes contra o patrimônio seria quase nenhum. Por que no Japão o crime de índice contra o patrimônio é quase zero? Será que no Japão as pessoas sabem melhor que não podem furtar? Não! É porque lá eles têm uma qualidade de vida que é condizente com o não querer praticar crime contra o patrimônio. A medida que você vai implementando medidas sociais você vai diminuindo criminalidade. Eu estive em uma favela com a turma do BOPE no Rio de Janeiro. Uma favela pequena lá tem 30 mil pessoas. A Rocinha tem 250 mil pessoas. De que adianta entrar a polícia se não entra saúde, educação, lazer, habitação? Isso não funciona. Muitas cidades aqui do Rio Grande do Norte não devem ter 30 mil habitantes. Em Minas trabalhei em cidade com 10 mil habitantes. O Estado polícia tem que vir, mas também o Estado serviço social. Precisa investir em escola, saúde. Em minha opinião, o problema do Brasil se chama corrupção. No dia em que houver um combate efetivo sério a corrupção as coisas vão melhorar. Precisa de um combate sério. O corrupto é um genocida. O corrupto é aquele cara que você está tirando foto dele nos melhores restaurantes de Natal, mas ele está lesando o erário em milhões e milhões. É esse cara que não deixa chegar o remédio na farmácia, é esse cara que não deixa o idoso ter um atendimento digno, esse é o genocida. Ele é que precisa ser combatido. Se combater esse cara primeiro, o resto fica fácil.
TN - O senhor é apontado como um dos mentores dos estudantes de concurso público. Qual seu olhar sobre o cenário de milhões de estudantes de Direito estudando para concursos públicos?
RG - O concurso hoje virou um grande filão. Precisa do concurso porque os cargos estão aí, existe a questão ainda da segurança, a questão do status profissional. O concurso reúne todos os atrativos e cada vez mais faz com que as pessoas saíam da economia privada.
TN - O cenário aponta que o estudante quando está concluindo o ensino médio tende a procurar o Direito já pensando em emprego público.
RG - Sobre o Direito ele é o que lhe dar mais alternativas em termos de concurso. Aí você pode fazer concurso no país todo, você não está limitado a sua cidade, seu Estado. Ele (o curso de Direito) abre muitas portas. Você é um engenheiro mecânico, químico tem uma vaga ou outra no concurso. Mas o Direito é uma profissão que é uma carreira que dá muitas alternativas. Essa é uma coisa boa do Direito.
TN - O que faz uma pessoa ser aprovada em um concurso?
RG - É muito estudo, muito. Eu, por exemplo, quando fiz concurso estudava 12 ou 14 horas por dia. Os concursos são muito seletivos. No Ministério Público de 4 mil candidatos passam 15 ou 20. Não existe ensino de excelência nas universidades. Porque quanto mais universidade maior tem que ser o corpo docente e isso prejudica muito. Por isso que os estudantes correm para os cursos (preparatórios) porque eles têm a nata dos professores. As pessoas vão migrando para os cursos.
Fonte: Tribuna do Norte
Nota da Mari:
Além de tudo que foi exposto pelo Rogério Greco, existem outras questões que, a meu ver, levam à corrupção do policial e ao abuso de poder. A falta de estrutura psicológica e de constante acompanhamento terapêutico, a falta de infraestrutura nas delegacias e o "prende solta" que coloca bandidos na rua após 24 horas.
O sistema penal não coopera muito com a vida do policial, quem assistiu ao documentário do post abaixo sabe do que falo. Além do mais, a desigualdade social cria verdadeiros inimigos públicos das casses altas e, por conseqüência, da classe policial.
Há que se rever os conceitos sociais e de valor do cidadão. O consumismo não é privilégio de classe social, ele é cultivado e exercido por toda sociedade brasileira, independente de sua condição financeira. A diferença é que para uns, esses bens de consumo, que custam vários dígitos, são mais fáceis de ser adquiridos que para outros, e isso gera a aversão entre as classes.
A meu ver, sempre será mais importante ser, que ter. Mas não serei hipócrita de dizer que ter não é importante. Gosto de alguns luxos, mas nada que seja fundamental para minha vida e essa é a grande diferença.
Abraços!