Parece um convite ao abuso de autoridade, mas é apenas um aviso pra pensar antes de agir. Eu era a única policial naquele salão, se não estava enganada. Ouvi a menina dizendo "não" com todas as letras mas o cara simplesmente não ouvia. Tem coisa que nunca muda. Muda o cenário, os personagens, mas o enredo é o mesmo. Me identifiquei formalmente como policial e perguntei qual era a situação. Eu já sabia o que estava acontecendo, mas era meio como uma autorização verbal expressa pra poder agir. "O senhor, por gentileza, vai ficar lá fora", disse a ele. Da mesma forma que o sujeito ignorava a voz dela, ignorou também a minha. Lembrei-me de um professor da Academia que falava que se o policial der a carteirada, ele tem que entrar. Penso que o princípio se aplica, da mesma forma, à ordem policial dada. Se você deu uma ordem ela terá que ser cumprida. Que droga! Agora eu teria que ir até o fim.
Aprendi com o Guerreiro algumas técnicas para serem utilizadas em situações em que você não pode fazer muito "barulho". Não pode sacar arma, não pode gritar, não pode fazer barraco, nem fazer beicinho, mas tem que agir. Eles chamam de ataque aos pontos de pressão, eu chamo de "delicadeza violenta", o pessoal dos Direitos Humanos chamam de tortura. Era a hora de usá-las. As pessoas começaram a perceber que alguma coisa estava acontecendo. A menina saiu logo de perto. Insisti na ordem dada. Ele retrucou que não podia sair e que ficaria lá até o final, por determinação do "dono da casa" e blá, blá, blá e pererê e coisa e tal... Eu sabia que ele estava mentindo. Como se não bastasse, o cara começou a ficar agressivo. Não chegava a ser uma agressividade violenta, era mais uma coisa de zombaria. Aquele professor podia ter avisado que cada segundo de resistência torna o dever de agir mais árido e mais difícil de suportar.
Não tirava o meu corpo da frente dele, fazendo com que ele fosse recuando de pouquinho em pouquinho. Podia ter feito aquela posição de águia do Karatê Kid, né? Não podia deixá-lo ganhar espaço. No mínimo ele deve ter pensado "Essa mulherzinha deve ser louca". É, eu sei. Foi loucura mesmo, burrice minha, porque ele poderia ter me machucado... Antes de dar o primeiro passo eu deveria ter pedido reforço da equipe que estava no terreo. Mas existe "risco zero" em alguma operação policial? Existe "risco zero" de se machucar em algum tipo de relacionamento? Existe "risco zero" na vida? Já ouviu falar que "O homem é o lobo do homem. Somos naturalmente violentos", ou que "A mão que afaga é a mesma que apedreja"? Portanto, "Ele poderia ter te machucado" é uma das frases mais inúteis na Polícia.
Nessa hora eu só queria ser um pugilista enorme. Ter pelo menos o triplo do meu peso e uns trinta centímetros a mais de altura. Queria ser um "armário" negão do Harlem. Aposto que a história seria outra. Tentava se esquivar de mim e eu me colocando na frente dele. Ninguém aparecia para ajudar! Minha solidão era tanta que não me deixava tirar os olhos de cima dele nem por um instantezinho sequer. Ele teria que sair dali, nem que fosse hipnotizado (Uma cobra "naja" não é lá um bicho "peso-pesado", e come até um boi! Ah não essa é outra cobra, né?).
O braço dele não era lá tão musculoso, pressionei o local certinho porque ele contraiu o corpo de dor. Ninguém viu isso porque eu estava de costas para o público. Apertava o braço dele toda vez que ele empacava. Sim, eu estava literalmente tentando, sozinha, tirar ele no braço! Percebi que nos aproximávamos da porta. Eu acho que ele se sentia tão ridículo sendo acuado por uma mulher, não exatamente pela mulher em si, mas pelas pessoas que deveriam no mínimo estar adorando aquela queda de braço.
Eu tremia nervosamente e o coração já não batia, esmurrava. Falei bem baixinho, quase sem mexer os lábios. Não sei se implorando ou apenas sussurrando: "você vai ter que sair porque eu estou mandando você sair". Notável que nem a minha retória é robusta. Mas entenda que na minha cabeça não era eu que estava ordenando, era a POLÍCIA. Ele tinha que me obedecer! Até porque eu não tinha a menor vontade de levar ninguém preso para a delegacia naquele dia. Ainda bem que o "dono da casa" que na verdade era uma repartição pública, não viu nada, estava em outro ambiente. Tenho certeza de que só pelo fato de eu ser policial ele tomaria as dores do sujeito. Não saberia o que fazer nesse caso. Apertei novamente o braço dele no mesmo ponto sensível. O braço dele já estava todo vermelho porque eu já tinha apertado o lugar errado uma dúzia de vezes, daí finalmente ele disse exasperado: "Tira essa mão de mim!". Eu já queria tirar o omoplata dele do lugar. Retruquei: "Eu tiro se você sair". Eu deveria estar vermelha de raiva. Ele falou por último: "Tira a mão que eu saio". Ele já estava vermelho de raiva. Soltei o braço dele, dando-lhe pelo menos uma saída honrosa. Ele disse no sufoco: "Agora eu saio" se virou e saiu.
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