Policial
E Por falar em Rio de Janeiro...
“Sei onde está o Nem (chefe do tráfico da Rocinha), e sei até o que tem dentro da casa dele. Não tenho medo de traficante. Mas não posso arriscar a vida dos moradores.” A afirmação é do Secretário de Segurança do Rio de Janeiro, o gaúcho ( Ex Delta da PF) José Beltrame que, em entrevista à revista ÉPOCA, deu detalhes sobre o planejamento da segurança do Rio.
Para o secretário, o incidente de sábado, por mais grave que tenha sido, não mudará o planejamento da pacificação das favelas: “A Rocinha terá a sua UPP (Unidades de Polícia Pacificadora), mas não agora. Faltam homens: seriam necessários 1.600, 1.800 policiais recém-formados e ainda não dispomos desse contingente”.
Pela lógica da pacificação, Beltrame calcula que, para ter chance de dar certo, é preciso colocar na comunidade um policial para cada 80 habitantes. Como a população da Rocinha passa de 100 mil, o investimento em recursos humanos é muito alto, proporcionalmente ao de outras áreas no Rio. Para se ter uma ideia, até o mês passado, o total dos policiais de UPPs em 10 comunidades pacificadas era praticamente o mesmo que precisará ser destinado somente à Rocinha: 1.880.
VEJA A ENTREVISTA:
ÉPOCA – Moradores da Rocinha dizem que Nem faz musculação todo dia na mesma academia, junto do portão 2, com 30 seguranças. Eles sabem os lugares que ele frequenta, onde come churrasco e a que horas, quem são suas mulheres, por onde ele anda. A polícia tem essas informações?
José Beltrame - Assim como a gente conhece o Nem, a gente sabe onde está o Fabiano, onde está o Polegar, e também o Marquinho Niterói, um traficante que na minha opinião é até mais importante historicamente do que o Nem.
ÉP– E por que eles não são presos?
JB – Para eu ir buscar essa pessoa a sociedade está disposta a pagar o custo de algumas vidas? Eu tenho que pensar nisso, porque eu sou um administrador público. Eu tenho que pensar que garantias vou ter para buscar o Nem na academia. Eu posso ir lá e tem polícia para ir lá. Mas eu, como administrador, tenho que ver o custo disso, social e o de vidas. Aliás, o número correto de homens armados na rua enquanto o Nem faz ginástica não é 30. São exatamente 17. Eu vou lá, sei o endereço, a rua, a casa e inclusive o que ele tem dentro da casa. Quando decidir entrar lá eu vou entrar e buscar porque se tiver que fazer guerra, vou fazer uma vez só. Esses caras para dar tiro se sentem à vontade, não têm nenhum apego à vida deles ou dos outros. Isso é uma coisa que não tem mágica. Muita gente antes de mim não quis fazer isso, mas também não buscou outra alternativa.
ÉP – E qual é a solução?
JB – Prender traficantes é importante, importantíssimo. Apreender as drogas é importantíssimo. Armas, é importantíssimo. Mas o mais vital é que se tire o território, e isso é que não foi feito antes e que nós começamos a fazer. Porque, se eu tirar o território dessas pessoas, eles se acabam. Não é o Nem, o Polegar, o Marcinho Niterói, é o território. Porque o território ele não substitui. O traficante, mesmo preso, ele continua tocando o negócio e se sente meio em casa, junto com os companheiros. Mas, sem território, não tem jeito. Vai para outra comunidade? É trucidado. Não é ninguém. É aquela história: touro no potreiro alheio é vaca.
ÉP – Quando a Rocinha vai ter uma UPP?
JB - A Rocinha vai ter, mas não dá para dizer quando exatamente porque isso envolve não só o sigilo do planejamento, mas a logística. Eu não tenho como entrar lá agora lá porque eu não tenho homens se formando numa quantidade suficiente a cada ano. Precisaria de uns 1.800 para colocar lá. Com a obra na academia, nós podemos formar 4 mil policiais por ano. E, só agora em 2010, conseguimos chegar a esse número. Até julho, nós tínhamos 1.880 homens em 10 UPPs, isso é quase o efetivo necessário para a Rocinha. Então, você tem que escolher se vai ter 10 comunidades pacificadas, com UPP, ou uma na Rocinha. Sem contar que, se escolhêssemos a Rocinha, certamente muitos iam dizer que só temos UPPs na Zona Sul e que nossa política é elitista. Nós temos um planejamento e vamos seguir. Durante 40 anos só se enxugou gelo na segurança do Rio. Tinha um tiroteio aqui, corria pra lá. Tinha outro, ia para outro lugar. De que adianta prender um chefão se tem outro na fila para pegar o lugar? Prendemos, no sábado (21), o Perna, que seria o natural substituto do Nem. A gente tem que ter muito cuidado, ir na base da faca na bota.
ÉP – O que pesa para dizer: vamos fazer agora num lugar agora, mas não vamos fazer na Rocinha?
JB – Levamos quase dois anos sentados discutindo os lugares e as prioridades. Nós levamos em conta índice de criminalidade, quantidades possíveis de armas, alcance dos tiros que são disparados, equipamentos públicos na favela. As ocupações precisam formar um desenho que abranja onde a cidade pulsa mais, onde as pessoas trabalham.
ÉP – Pelo que se viu nos vídeos, o poderio de fogo na Rocinha é imenso. Fala-se num exército de 300 homens...
JB – E quem contou? Para mim, 80% dos bandidos do Nem da Rocinha estavam nesse evento no fim de semana. E ali eram quantos? O pessoal chuta 70. Isso é uma coisa que alguém lança, 150, 300, e aquilo fica como verdade. Fora aquelas pessoas, o que pode ter lá em cima do morro ainda? Mais umas 20 pessoas? Saiu um bando correndo lá para o Hotel Intercontinental. Três ou quatro, como eles sempre fazem, ficam resistindo. O Nem foi quase rendido, um policial chegou a enquadrá-lo, mas não atirou porque ele estava correndo dentro de um condomínio, poderia haver vítimas. Para mim, é mito que ele tenha 300 homens, não acho factível.
ÉP – A polícia tinha informação de que Nem estaria numa festa do morro vizinho, o Vidigal?
JB – De quinta-feira a domingo, nos vem muita informação de que vai ter baile aqui e ali, mas é no “poderá”, “haveria”, “poderia” e nós não vamos para todos os lugares. E muito menos nós temos um catálogo de dias de aniversário dos traficantes.
ÉP– Mas dos mais importantes vocês sabem. Todo mundo sabe na Rocinha quando vai ser o aniversário do Nem.
JB – Alguns, claro, a gente sabe. Quando a gente sabe, o que faz? A gente represa o lugar. Você imagina que, se tivesse em São Conrado uns 30 policiais na hora do encontro com os traficantes, ia ser muito pior do que foi. O policiamento do 23º Batalhão (Leblon) recebeu um alerta de que “poderia” haver uma festa no Vidigal e que o chefe dos traficantes do Urubu poderia vir com o seu bando lá da Zona Norte da cidade para São Conrado, na Zona Sul. O alerta foi na sexta. Havia duas patrulhinhas, com dois homens em cada carro, quando encontraram a van com os 15 bandidos por acaso. E começou o enfrentamento, de madrugada. Esse povo voltava do Vidigal para a Rocinha.
ÉP – De onde surgiu a informação de que 12 policiais à paisana tentaram prender Nem?
JB – Boa pergunta. Eu também queria saber isso. Já que levantaram essa possibilidade, eu pedi para instaurar um inquérito e verificar. Mas, gente, 12 policiais vão enfrentar 60 bandidos lá dentro da favela? Podem ser policiais, mas, se fizer um eletroencefalograma neles, vamos ver que loucos eles não são.
ÉP – Para a imagem do Rio, foi péssimo o que aconteceu. As imagens correram o mundo...
JB – Muito melhor seria que não tivesse acontecido, mas poderia ter sido bem pior. Se não houvesse enfrentamento, se duas patrulhinhas não tivessem encontrado a van com os bandidos no caminho, nada disso teria ocorrido. Tínhamos 800 pessoas no hotel, reféns e todas se salvaram. Os reforços policiais que chegaram foram decisivos. Tudo terminou com uma só vítima fatal – uma mulher que trabalhava para eles no caixa do tráfico e cujo corpo foi jogado no asfalto para a gente recolher. Prendemos 10, apreendemos fuzis. E eles serão enviados para Rondônia. Mas foi uma infelicidade. Eu costumo dizer que, infelizmente, até que o novo Rio seja uma realidade completa, nós vamos ter que conviver com esse velho Rio.
NOTA DA MARI:
Mais uma vez José Beltrame mostra por que tem o cargo de Secretário de Segurança Pública e o meu respeito.
Ao BOPE, minha humilde e infinita admiração, assim como o menino da foto abaixo, também quero um autógrafo.
Abraços!
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